quarta-feira, 30 de abril de 2008

coringão!


Como falei mais abaixo, sou mineiro. Embora tenha sempre morado no estado do Rio ou na cidade do Rio, torço pro Coringão. E há muito o time não traz alegrias para sua torcida. Pra quem não sabe, no último Brasileirão caiu pra segunda divisão. Não precisa dizer mais nada. Há duas semanas perdeu de 3 x 1 pro Goiás, na Copa do Brasil. Não ligo muito mais pro Corinthians (na infância era meio fanático, e tive meus momentos de glória), mas hoje fiquei sabendo que era o jogo de volta contra o Goiás. Pensei, estou em casa, vou ligar o computador e escutar o jogo (já que estou sem televisão aqui em casa - e também não deve estar passando, dão sempre preferência para os times cariocas, não sei o porquê). E não é que embora com pouca esperança, começo a torcer e em 29 minutos de jogo, Coringão já mete logo 4 gols. Aí até anima torcer. Tomara que não esteja me enganando e o Corinthians pelo menos se classifique para a próxima fase da Copa do Brasil. Digo isso porque ainda temos pelo menos 45 minutos do segundo tempo. Amanhã espero não ler nenhum comentário do tipo "quem ri por último ri melhor" ou "o jogo só termina quando o árbritro apita". Vamos ver. E torcer.
***
Pra melhorar, o Palmeiras (da Clementina), que está na final do Paulista (droga!) e ganhou o primeiro jogo da Ponte Preta (droga de novo!) está perdendo pro Sport Recife (maravilha!) por 4 x 1 (MARAVILHA!!!) e está desclassificando-se. Pra passar precisa empatar. Agora é só perder pra Ponte Preta no domingo.

bar

A moça chegou com sapatinho baixo, saia curta, cabelos lisos castanhos arrumados em rabo-de-cavalo, sorriu dentes branquinhos muito pequenos, como de primeira dentição, e falou o senhor me deixa telefonar? de maneira inescapável.

O homem da caixa registradora estava olhando o movimento do bar, tomando conta de maneira meio preguiçosa, sem fixar muito os olhos no que o rapaz do balcão já havia servido aos dois fregueses silenciosos, demorando-os mais no bêbado que balançava-se à porta do botequim ameaçando entrar e afinal parando-os no recheio da blusinha preta sem mangas que estava à sua frente, o que o fez despertar completamente com um e a senhora o que é?

A moça constatou contrariada que havia desperdiçado a primeira carga de charme e mostrou novamente seus pequeninos dentes, agora fazendo a precisadinha urgente, dizendo eu posso telefonar? com ar de quem entrega ao outro todas as esperanças.

O homem falou pois não e levantou a mão meio gorda do teclado da caixa registradora, abaixou-a olhando para o bêbado que subia o degrau da porta, retirou de uma prateleira debaixo da registradora um telefone preto onde ainda estava gravado no meio do disco o selo da antiga Companhia Telefônica Brasileira e empurrou-o para a moça dizendo não demore por favor que já vamos fechar.

A moça tirou o fone do gancho e murmurou baixinho putz, sopesou ostensivamente o aparelho e disse bajuladora pesadinho hein?

O homem sorriu atingido pela seta da lisonja dizendo éééé antigo.

A moça levou o fone ao ouvido e discou 277281 com um dedo bem tratado de unha lilás.

O homem da caixa tirou os olhos do dedo, pegou um lápis enganchado na orelha direita e anotou a milhar explicando é pra o bicho, não se importando se a moça ouvia ou não e devolveu o lápis à orelha enquanto olhava o bêbado que navegava agora à beira do balcão.

A moça falou quer fazer o favor de chamar o Otacílio e ficou esperando.

Um homem chegou ao lado dela cheirando a cigarro, falou para o caixa me dá um miníster, olhou intensamente os olhos dela e imediatamente os seios.

A moça enrubesceu e se tocou rápida procurando o botão aberto que nem havia e protegeu-se expirando o ar com o diafragma e avançando os ombros para disfarçar o volume do peito.

A caixa registradora fez tlin, um carro freou rangendo pneus e uma voz forte gritou filha da puta com um u muito longo.

O homem da caixa deu o troco ao homem que comprara cigarros e falou faz de conta que não ouviu nada menina isso aqui é assim mesmo.

O homem que comprara cigarros afastou-se e foi ver da porta o que estava acontecendo na rua.

A moça voltou-se simpática para o homem da caixa mas parou atenta aos sons do fone, mudou de atenta a decepcionada e falou depois de instantes diz que é a Julinha.

O homem que comprara cigarros parou na porta, abriu o maço de cigarros e acendeu um.

O homem da caixa falou ô José esse aí tem de pagar primeiro e o rapaz do balcão parou de servir a cachaça para o bêbado e falou qualquer coisa com ele enquanto o homem da caixa procurava explicar-se dizendo depois não paga e ainda espanta freguês.

A moça sorriu condescendente.

O homem fumava à porta e olhava as pernas dela.

A moça pôs uma perna na frente da outra defendendo-se cinqüenta por cento e falou de repente alegre oi! demorou hein? E procurando um pouco de privacidade virou-se dizendo ficou com raiva de mim?

O homem da caixa fingia-se distraído mas ouvia o que ela dizia.

Pensei. Não me ligou.

O bêbado navegou contornando arrecifes e chegou ao caixa com uma nota de quinhentos na mão.

Mas não é isso, não é nada disso.

O homem da caixa disse pode servir José.

Não sei... fiquei com medo, só isso.

O bêbado começou o cruzeiro de volta.

Não, não. Não é de você. Acho que é assim mesmo, não é?

A caixa registradora fez tlin marcando quinhentos cruzeiros.

Poxa, Otacílio, pensa. O tanto de coisa que vem na cabeça da gente numa hora dessas. Vocês acham tudo fácil.

A cara do homem da caixa estava um pouco mais desperta e maliciosa.

Claro que é difícil. É só querer ver o lado da gente, pô.

O rapaz do balcão tirou o mesmo copo meio servido e a mesma garrafa e completou a dose do bêbado.

Tá legal. Eu também acho: vamos esquecer o que aconteceu ontem. Falou.

O bêbado olhou atentamente para o copo como se meditasse mas na verdade apenas esperando o momento certo de conjugar o movimento do navio com o de levar o copo à boca e quando o conseguiu bebeu tudo de uma vez com uma careta e um arrepio.

A moça ouviu com ar travesso o que Otacílio dizia e sorriu excitada seus dentes branquinhos.

O homem da caixa olhou para o homem da porta e a cumplicidade masculina brotou nos olhares.

Não, sábado não dá. Aí já passou. Ora, como. Passou do dia, Ota, não dá. Não dá pra explicar aqui. Você não entende? Tem dia que dá e tem dia que não dá, pô.

O homem da caixa piscou para o homem que fumava na porta como quem diz você que tava certo.

Uai, só daqui a uns quinze dias. Lógico que eu me informei.

A moça viu o olhar do homem da porta e virou-lhe as costas.

Hoje!? Tá louco?

O homem que fumava ficou olhando-a por trás.

Papai não vai deixar. Só se... Só se eu falar com a mamãe e ela falar com ele.

Alguém chegou e falou cobra duas cervejas e me dá um drops desse aqui ó hortelã.

Ora, que que eu vou falar. Não sei, pô. Eu dou um jeito. Pode deixar que eu me viro.

A caixa fez tlin e o homem foi embora sem que ela o visse.

Não, eu vou. De qualquer jeito eu vou. Agora eu que tou querendo.

A moça olhou para o homem da caixa e fugiu depressa daquela cara agora debochada.

Então me espera. Eu vou aí. Chau.

A moça desligou e ficou uns instantes com o olhar baixo tomando coragem e depois falou para o homem posso ligar só mais unzinho?

O homem da caixa falou pode alongando o o muito liberal e olhando fixamente de cima a sugestão do decote.

A moça procurou um ponto neutro para olhar e achou o rapaz que lavava copos atrás do balcão, enquanto esperava o sinal do telefone, depois discou 474729 e ficou olhando o ambiente.

Uma armadilha azul fluorescente de eletrocutar moscas aguardava vítimas.

O rapaz do balcão olhava-a furtivamente e murmurou gostosa, de dentes trincados.

O bêbado esperava o melhor momento de descer do degrau para a rua com um pé no chão e outro no ar, como alguém inseguro que se prepara para descer de um bonde andando.

O homem da porta juntou os cinco dedos da mão direita e levou-os à boca num beijinho transmitindo ao homem da caixa sua opinião sobre ela.

O homem da caixa respondeu segurando a pontinha da orelha direita como quem diz é uma delícia.

A moça murmurou será que saíram? explicando-se para ninguém.

Os dois homens silenciosos que bebiam cerveja encostados no balcão não estavam mais lá.

A moça ficou de lado e o homem da caixa fez um galeio para ver um pouco mais de peitinho pelo vão lateral da blusinha sem mangas.

A moça emitiu um ah de alívio, puxou o fio até onde dava e meio abaixou-se de costas para dizer mamãe? é Júlia com uma voz abafada por braços e mãos e concentrada no que ia dizer.

O homem da porta, o rapaz do balcão e o homem da caixa se olharam rapidamente.

Olha, eu jantei aqui na cidade com a Marilda. Ora, mamãe, a senhora conhece a Marilda, até já dormiu aí em casa. É, é essa. Olha: agora a gente vai ao cinema, viu? Que tarde, mamãe, tem uma sessão às dez e meia. Se ficar muito tarde eu vou dormir na casa dela. É só porque é mais perto, mamãe, senão a gente ia praí. Não tem. A senhora sabe que não tem. A senhora fala com papai pra mim? Não, eu não vou falar. Tá bom. Eu ligo depois do cinema. Só pra confirmar, hein, porque o mais certo é a gente ir pra lá. Um beijo. Bota a gatinha pra dentro, viu? Chau.

A moça ergueu-se, desligou o telefone e perguntou quanto é.

O homem da caixa não estava mais lá e falou pra você não é nada gostosa, atrás dela.

A moça se voltou rápida e viu que todas as portas do bar estavam fechadas.

Os três homens, narinas dilatadas, formavam um meio círculo em torno dela.

Ivan Ângelo em "A Face Horrível", Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 1986. O conto também está presente no livro "Os cem melhores contos brasileiros do século", seleção de Ítalo Moriconi, Editora Objetiva, Rio de Janeiro, 2000.


Mineiro de Barbacena igual ao cajibrina - e as semelhanças param por aí -, Ivan Ângelo nasceu em 1936. Publicou seu primeiro livro, "Homem sofrendo no quarto", em 1959, conquistando o prêmio "Cidade de Belo Horizonte". Em 1961, lançou "Duas faces", com sete dos contos premiados, alguns novos e dois do amigo Silviano Santiago. Mudou-se para São Paulo em 1965. A revolução iniciada em abril de 1964 inibe sua produção literária. Seu romance "A festa", iniciado em 1963, só foi concluído em 1975. Publicado no anos seguinte, conquistou o prêmio Jabuti. Outros livros do autor: "A casa de vidro", "A face horrível" (prêmio APCA-1986), "Amor?" (prêmio Jabuti - 1995), "O comprador de aventuras e outras crônicas", "História em ão e inha", "O ladrão de sonhos e outras histórias", "Pode me beijar se quiser" (prêmio APCA-1999), e "O vestido luminoso da princesa", entre outros.

segunda-feira, 28 de abril de 2008

em solidariedade ao andré

Ia postar como um comentário no blog - ou quase-blog – amigo. Mas aí era grande. Mas postar por aqui era meio copiar demais. E não estou aqui para escutar “que cara sem criatividade, fica copiando as idéias dos outros”. Não que eu não copie. Mas o meu ‘amigo’ candidato pelo menos era mais direto. Nem me incomodei. Mandou o seu recado, tá mandado. Não veio com falsas saudades, apenas um exagero me chamar de ‘meu grande amigo Sr. Fulano de Tal – com sobrenome e tudo. Mas foi diretão ao assunto, sem meias palavras. Na segunda frase já diz: ‘Estou me candidatando a vereador...’. Meu CEP então, nem cogitou perguntar (até porque Valença, cidade grande, tem um CEP só pra cidade toda).

Aí o que não dá é pra agüentar um cara que envia um email desses, provavelmente pra uma mala direta com alguns nomes, sem dar uma revisada no português. Não sei se porque acabo, por ofício, corrigindo muito texto, uns erros grosseiros doem minha vista. Por exemplo, ‘cadidatando’, muito provavelmente é erro de digitação, mas se é uma coisa que ele considera séria (será?), acho vale uma revisão. Um acento no ‘é’ também faz toda a diferença: ‘O Meu propósito para se candidatar e poder viabilizar a área de Esporte e a juventude da população da nossa cidade’. A má escrita nem discuto.

Uns trechos, à moda André Lima:

‘pedir ajuda aos meus amigos e conhecidos para que possamos mudar Valença em Geral’. Aquele esquema, ‘possamos’, como se eu tivesse alguma coisa a ver com ele...

‘Gostaria muito de poder está fazendo parte e brigar cada dia mais para o futuro dos nossos filhos e garantir uma melhora de vida e principalmente pensar nos Idosos que são a maioria em Valença!’ Filhos, idosos, está fazendo (estar fazendo já seria péssimo);

‘A minha caminhada começou em bairros de pereferia onde é extremamente prioridade’. PerEferia. Fiquei na dúvida se ele prefere ou se está falando dos bairros mais afastados do centro...

‘E assim vou buscando repeito e simpatia dos eleitores e assim vou fazer tudo o que está ao meu alcance’. E assim num consegue meu voto...

‘Por isso venho aos meus amigos, pedindo apoio nesse momento crítico que a cidade de Valença está ser tornando. Uma cidade VAZIA!!!!’. Momento crítico que a cidade está se tornando?

‘Meu muito obrigado e espero poder contar com Vocês meus amigos de Fé!
Um abraço de seu amigo (...)’. Vai na fé!

a banda

Sadraque, Ratão, Manguaça, Bebudo e Capilo. Tão indo pra Valença. Mas antes, passaram em Paty do Alferes, que não era caminho. Mas iam para uma reunião na Câmara de Vereadores. Coisa de discussão de desenvolvimento local. Estariam representando Valença. Coitada.

Chegaram, cada um a seu estilo. Bebudo, todo arrumado, estilo social, saindo do trabalho e indo direto. Mas também por que sempre gostou de parecer um cara sério. Nunca conseguiu. Manguaça, que nem estava bebendo, a seu estilo rasgado. Calça social, chinelinho havaianas, um pretenso cavanhaque. Um cara que você olha e acha estranho. No mínimo.

Completavam a figuração Capilo, barba por fazer (há uns três meses) e cabelo (há uns três anos) e não tão rasgado quanto Manguaça. Sadraque, um negro de 1,80 de altura, voz de locutor de rádio (daqueles antigos), com sua bandana na cabeça, que não tirava por nada. A desculpa era que estava deixando crescer a juba pra fazer um rasta. Por último, Ratão, meio baixo, meio magro (mas com uma barriguinha saliente), piercing por todos os lados do rosto, sempre de preto, cavanhaque nunca fez (gosta de ficar fazendo tranças quando está à toa).

Estavam todos lá, serelepes. Atrasados. Como não poderia deixar de ser onde chega um grupo tão, tão... desse jeito, um deles (o que gosta de aparecer, num precisa repetir o nome dele aqui) chega pedindo a palavra. Silêncio.

– Gostaria de pedir desculpas pelo atraso. Viemos do Rio, saímos correndo dos respectivos trabalho, por isso a demora. Mas agora estamos aí.

Ou seja, pediu a palavra só mesmo para atrapalhar. Ou aparecer.

Chegamos já quase na hora do cofibreique. Todos comem bastante. Repetem. Nada de álcool. Menos mal, que esses aí num têm limites. Voltam pra reunião. Bebudo, sempre ele, pede a palavra. Rechaça a secretária de Turismo regional. – Para discutir turismo, antes temos que discutir o desenvolvimento local. Turismo é conseqüência!, bradou. Mal sabia que estava numa reunião com todos os secretários de Turismo da região. Menos a secretária de Valença, que não apareceu.

Discutiram lá. O grupo meio disperso, só mesmo Bebudo com a paciência de permanecer lá. Sadraque já tinha descolado uns biscoitos de gengibre e andava pra baixo e pra cima, já conhecia o dono do bar em frente à Câmara. Inclusive quase ficou por lá, disse que já tinha onde dormir, etc. Coisas de Sadraque.

Manguaça tava dando sua cochilada diária de final de tarde, na cadeira da reunião. O barulho não o incomoda. Já está acostumado. Segundo ele, até ajuda. Coisas do Manguaça.

Capilo, metido a jornalista, fez algumas anotações até o meio da reunião. Mas, sensato, percebeu que aquilo ali não renderia nem nota de rodapé. Começou a desenhar coisas irreconhecíveis até pra ele. Coisas de Capilo.

Ratão... Bom, Ratão ninguém sabia onde estava. Desde o intervalo que ninguém mais o viu. Só mesmo no final, quando todos voltaram para o cofibreique (ou seria cofiend?), encontraram ele lá, sentado na cozinha, dizendo que estava passando mal. Comeu demais. Ficou todo o resto da reunião na cozinha, comendo. A explicação:

– Ah, veio uma mulher aí e perguntou se a gente era a banda que ia tocar hoje aí em Paty. Num sabia o que falar e falei que era. Aí ela veio querendo me agradar, oferecendo comida e tal. Eu num ia rejeitar. Tô indo pra casa do Capilo, num sei qual vai ser minha próxima refeição...

A banda foi embora para Valença. Sem tocar.

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Café, cachaça e chorinho

Esse feriado estive em Valença. Estava rolando o festival Café, Cachaça e Chorinho. O primeiro eu não bebo. Eu e parece que quase ninguém. As barracas de cachaça sempre cheias de gente ao redor, querendo mais e mais amostras grátis. Na de café, nem atendente eu encontrei. Quando vi, estava com um copinho de café na mão. Cheio de cachaça.

*****

Barril 39, cachaça da terra valenciana, ganhou o primeiro lugar, pelo voto popular, no concurso da melhor cachaça, realizado no domingo em Piraí, como parte do Festival. Quem quiser uma amostra, 20 reais a garrafa. Vale o preço.

vestibular, cachaça e pouca vergonha!

Manguaça e Pablo, ainda jovens, cheios de disposição. Tiveram uma boa idéia. Onde, não precisa dizer. Bar do Betão, no Jardim Valença. Único bar 24h de Valença e que vende mais litro de cachaça que de cerveja.

– E aí Manguaça, vamos estudar pro vestibular? To querendo fazer direito e tal, a gente podia estudar junto, um tira a dúvida do outro.

– Boa Pablo. História, Geografia e Português a gente estuda em casa. Mas seria bom estudarmos juntos Física, Matemática, Química...

Ficou marcado. Dia seguinte começariam os estudos, na lojinha embaixo da casa do Pablo. Sete da noite. Primeiro dia era Física. Pablo arrumou um livro, segundo ele dos bons. Primeiro exercício pra cá, primeiro exercício pra lá, e nada de resolverem. Manguaça:

– Estamos meio fora de ritmo, precisando de um estímulo pra dar o pontapé inicial. Vamos tomar uma cerveja. Tomam uma, Pablo fuma um cigarro. Voltam. Já pra o exercício dois, que o um estava mesmo emperrado. Dois nada. Foram tomar outra cerveja, pra dar uma iluminada nas idéias, tentar entrar no ritmo no tranco. Vão se animando nas cervejas.

– Pablo, seguinte, o problema é hoje. Hoje num tá dando pra estudar. Vamos começar amanhã. Esse calor não combina com essa Física aqui, combina muito mais com essa cerveja gelada. Vamos fazer o seguinte, a gente lê em casa e vem aqui só pra tirar as dúvidas.

– Beleza, então vamos lá tomar a saideira no Betão. Vai saideira um, dois, três... Aquela velha história, Manguaça só toma saideira ímpar e Pablo só saideira par. Aí já viu. Geralmente a saideira é quando o dinheiro acaba, que pra eles, infelizmente, não demorou muito.

– Pablo, sei que você tem um porquinho com suas economias aí, quebra ele lá. Abriu, beberam mais umas e acabou também. Tinham que dar um jeito. A vontade só aumentou. – sua mãe sempre tem um vinhozinho aí na dispensa, vamos achar aí. – Não pô, pegar da minha mãe não. – Que não o quê? Vamos lá! Acharam duas garrafas de vinho. As duas desceram rápido, igual água. Aí ferrou, a sede continuava. Mãe do Pablo uma pessoa muito religiosa, devota de São Jorge, Manguaça olha pro balcão e vê que ela deixou lá um pinga ao lado do santo, garrafa de dois litros, daquelas de coca-cola. Num deu outra. Pablo ainda foi meio reticente – Se é pro santo, melhor ainda. Santo precisa de um corpo material pro espírito absorver a bebida.

– Bebi a garrafa toda e não bebi um gole, porque não fiquei tonto, só deu mais sede. Alguém bebeu pra mim isso aí, só servi mesmo de corpo material pra algum espírito.

Sem cerveja, sem dinheiro, sem vinho, mais nada na dispensa. – sua mão deve ter umas economias aí Pablo, depois eu pago, vamos achar isso aí. – Não, não, dinheiro da minha mãe não. Sorte que não acharam, que bêbado perde o juízo. Dizem.

– Pô, mas o Léo tá me devendo uma grana. Passei uma camisa pra ele e não me pagou. – Quanto? – 10 reais. – Ô, dois garrafões de pinga no JB e ainda dá pro chiclete. Vamos lá na casa dele agora.

(Aqui um parênteses, pra entenderem onde o Léo morava. Uma vila, com um corredor e as casa do lado. As janelas dão para o corredor. Léo morava na última casa. Pra chegar lá, passam por todas as casas e todas as janelas. Nesse dia eram umas onze da noite, algumas janelas já fechadas, mas não todas).

– Qualé Léo, vim pegar meus 10 reais aí malandro. Mais de um mês e não me pagou. – Pô, Pablo, num tenho o dinheiro agora não, cara. Manguaça: então vamos revirar sua casa, tem que ter algo de valor aí. – Não, num pode entrar aqui não, minha mãe e minha irmã estão aqui, peralá! – Não rapá, dá alguma coisa aí que a gente penhora lá no Betão e depois você pega lá e paga a conta. – Cês já tão bêbados, peralá. Amanhã arrumo isso pra vocês.

Manguaça e suas idéias brilhantes. Gritou. – Então vou fazer um protesto aqui hein! Arrancou o cinto da calça. – Aí Pablo vamos ficar nu aqui! Era a última chance. Manguaça olha pro lado, Pablo já só de cueca, pegou a calça e jogou dentro da casa do Léo. A camisa jogou pro alto e agarrou num fio. Corria prum lado e pro outro gritando, todo mundo da vila olhando. Léo tentava devolver a calça. Manguaça ria e colocava pilha.

– Tira a cueca Pablo! Tirou. No que tirou Léo abaixou pra tentar levantar a cueca. Na hora que estavam numa posição comprometedora aparece Espaguete, que tem esse apelido porque um dia já foi magro, antes de entrar pra academia e se tornar conhecido na cidade pelo excesso de músculos. Pra azar deles, Espaguete morava na vila.

– Que pouca vergonha é essa aqui!!?

– Manguaça puxou Pablo e saíram correndo. Pablo de cueca e Manguaça apenas sem camisa e cinto. Deram uma caminhada de uns 3 quilômetros até a casa do Pablo. Desistiram de beber naquele dia.

*****

Dia seguinte, Pablo, cara-de-pau, liga pro Léo. – E aí, posso ir aí pegar minha calça?

Léo, meio puto, meio sem jeito, meio sem graça, fala que sim. – Mas anota o endereço aí, que estou na casa da minha avó. Galera expulsou a gente da Vila.

meia e tênis

Coisa de bêbado sem noção. Quase completamente nu, Pablo anda pela cidade. Os amigos acompanham, mas todos de roupa (mas pelo menos também bêbados). Chega o policial e vê a cena, menino nu, apenas de meia e tênis.

– O quê que vocês tão fazendo aí!?

– Lavando o pé na mina ali, responde Pablo.

vortei!

Aos amigos que se dão ao trabalho de ler isso aqui, minhas desculpas. Computador pifou, faltou dinheiro pra consertar e Fidel, o ratinho do Panamá, fez o computador de ninho. Aí deu mais problema. Mas agora voltou. Seu Manoel falou que eu era menos chato quando tinha o computador e agitou uma vaquinha no bar pra bancar o conserto.

Tô de volta. E sem dengue.

quinta-feira, 10 de abril de 2008

mais remédio

Faz mais ou menos duas semanas e a tal da dengue, que na verdade nem sei mais se é dengue, me rodeia. Tá rodeando, rodeando, médico um fala que num deve ser, o dois fala que é possível, mas num dá pra ter certeza, o terceiro (sem fazer o exame de sangue – os dois primeiros se balizaram nos exames) disse, com certeza não é dengue. É uma virose qualquer. O um manda tomar Tilenol, o segundo Tilenol DC (que é mais forte) e o terceiro fala que Tilenol nem pensar, que dá insuficiência hepática e pode matar. Só Dipirona mesmo. Pelo sim pelo não, prefiro viver e insuficiência hepática vai ser dose, ainda mais que acredito que o figo num tá lá essas coisas. Crise alérgica de ter que tomar antialérgico na veia. Com a alergia, além da dor de cabeça permanente, dor no corpo. Sintoma de dengue, imagino, no afã de querer descobrir o que tenho e inundado da palavra ‘dengue’ por todos os meios. Médico quatro ainda não encontrei hoje. Fui pro hospital umas 10 da manhã, e agorinha, 4 da tarde, consegui ser chamado pra fazer um exame de sangue. A situação, ao invés de melhorar nos hospitais, está piorando. Semana passada em quatro horas fui atendido, fiz o exame, veio o resultado e fui liberado. Hoje, em seis horas, só consegui fazer o exame (eles nem passam mais por médico, ‘pra adiantar’...). exame fica pronto em duas horas (‘masdeve demorar umas três, três e meia, que hoje está meio cheio’, informa uma enfermeira à meia boca). Imagino. Semana passada era em 40 minutos e demorou duas horas. Agora sendo duas horas, enfermeira estimando em três e meia, só amanhã...

Enquanto isso, fico na dúvida. Os amigos ou os médicos, pessoas formadas durante num sei quantos anos, estudadas, conscientes de seu dever de salvar vidas. Andei pela lógica um tempo, esperando uma solução dos especializados na situação. Até agora nada. Negócio é dar valor mesmo aos amigos. Chaparral deu a receita e eu não segui como prescrita. De manhã tava complicado descer e pedir uma cachaça. A pior hora é justamente pela manhã, pra levantar é um sufoco. Pareço velho, cheio de dificuldade pra andar, corpo todo doído. A do almoço até rolava, mas nem todos os dias consegui almoçar por causa do trabalho. Foi ficando. A da noite, já em casa, deitado, era complicado. E sem limão em casa, imaginei que pura não adiantaria.

Percebi que os amigos e os anônimos estão mais preocupados com minha saúde que o corpo clínico dos hospitais cariocas. A azia, muito provavelmente causada pelos remédios e intensificada pela acidez do limão, já tenho receita de cura: jurubeba. Pro fígado, que podia estar sendo atacado pelo Tilenol, carqueja nele.

Ah, pra satisfazer a curiosidade dos muitos comentários aqui no blog, daqui a pouco volto pra pegar o resultado do exame, e em breve dou notícias da melhora ou piora. Mas fato é que remédio que veio em receita com CRM num deu resultado. Depois de pegar o exame, chuto e balde e vou pro bar do Arlindo. Ou então pro Like´s Bar, do lado do São Lucas. E domingo a medicação é onde e que horas?

quinta-feira, 3 de abril de 2008

medicação caseira

Saio do hospital. Tomei uns litros de soro na veia e estou novo. Médica vem, toda simpática, e diz que já posso ir para casa, mas para ter um certo repouso. Mas já estou bem pra ir embora. Na saída, uma enfermeira (acho que agradou de mim) diz que é pra tomar muito cuidado, que tem gente que sai e acaba voltando, pior do que entrou da primeira vez. Disse ainda que a médica disse isso porque não tem mais nenhuma vaga e estão dando prioridade para quem está em estado pior. Justo. Saí andando, me sentindo bem, fora a dor de cabeça e uma certa vontade de ficar com o olho fechado.

Na saída, não recomendaram nada além de não fazer muito esforço. Parei no Miraflores, primeiro bar no caminho e pedi uma cerveja, pra continuar o processo de hidratação. No balcão estava Chaparral. Duas da tarde, ele e eu apenas no buteco, e conversamos. Falei que estava saindo do hospital, coisa de dengue. “Ih rapá, esse negócio de remédio que eles dão no hospital num adianta de nada".

– Juarez, desce uma branquinha aí pro rapaz aqui

– Oh Chapa, tô convalescente ainda, nem cerveja num devia estar bebendo.

– Que convalês o quê! Pára de viadagem.

– Ai, ai ai.

– Espreme aquele limão, Juarez. Seguinte, Cajibrina, tive essa dengue aí e o negócio foi feio pra mim. Fiquei cinco dias com o corpo todo doído, cabeça num parava de doer, fora a febre. Nos dois primeiros dias tomei os remédios dos médicos e nada de melhorar. Aí passei a tomar, três vezes por dia, uma cachaça com limão. Na hora que acorda, depois do almoço e de noitinha. E toma bastante suco de laranja, nem muito gelado, nem muito quente, que quente é uma merda! No sexto dia levantei e não sentia mais nada!

– Num sentia mais nada de bêbado... - comentou Juarez, sentado sobre o frezzer.

Vamos ver se dá resultado. Comecei com a medicação hoje após o almoço.

quarta-feira, 2 de abril de 2008

é dengue?

Macarrão hoje ligou falando que tá com dengue. Voz empossada, “cerveja, água, hdoisó” de fundo na ligação. Em suma, barulho de praia e ele falando que estava no hospital. Mas ligou pedindo pra quebrar essa pra ele, ficar em seu lugar hoje, já que tava morando/trabalhando no Panamá mesmo. Fiquei o dia inteiro no balcão, só que dessa vez, do lado de dentro. Cheio de pinguço pedindo fiado. Num liberei pra ninguém, esse povo que fica querendo dar calote, onde já se viu.

Fiquei desconfiado do Macarrão. Camarada devia estar na praia, curtindo, tomando a sua cerveja. Primeiro pensei, se for só hoje, ok, tá certo, ele merece, já liberou várias Antarcticas pra mim. Mas aí entra o RJ TV na tela. Maior fila e pelo jeito, tinha mais vendedor ambulante na fila do hospital que na praia. Mais vendedor ambulante e mais gente. O negócio está feio.

Eu também não agüentei ficar o dia inteiro atrás do balcão. Passou o almoço, filei a bóia do Macarrão e disse pro seu Manoel que tava com suspeita de dengue, dor de cabeça intermitente, coisa e tal. Ele disse pra eu sair logo dali, que ele não queria pegar isso, pra eu ficar longe. Ia explicar que dengue não se pega assim, tem o tal do aedes, mas achei melhor mesmo sair dali. A cabeça doía realmente.

Fui. Inclusive pro hospital. De casa, pro Panamá e agora já tô morando no hospital. Aqui até é bom, servem almoço, janta, e espero que amanhã de manhã um café reforçado, que lá no Panamá hoje só tinha sobras, aquele torresmo que ninguém teve coragem de pedir, e duas azeitonas. Achei até que isso que tinha me feito mal. Mas o exame de sangue falou que é a tal da dengue.

Mas esse conforto aqui no hospital hoje foi custoso. Logo que cheguei escutei, do pessoal do lado de fora (porque não cabia mais ninguém dentro): “É o fim da picada”. Pensei comigo, tomara, que aí num tem a tal da bendita dengue. Mas foi dessa vez. Deu plaquetas ou leucócitos ou hemácias ou sei lá o quê acima ou abaixo do ideal, e era dengue. Isso depois de seis horas de espera entre ser atendido, fazer o exame e sair o resultado. Depois mais umas duas e estava internado, num esquema improvisado, cheio de dengosos ao meu lado tomando soro. Cerca de 50 pessoas. Isso num hospital particular. Lembrei do Macarrão, no Miguel Couto...

Ruim aqui é que falaram que cerveja nem pensar. Atrapalha o processo de hidratação necessário para curar a dengue. Mas tem que beber muito líquido. Sede pelo menos não falta.

terça-feira, 1 de abril de 2008

trabalho (de novo)

Trabalho. Agora não o meu, mas do cidadão que estava no caminho que eu percorria: “Nem o mosquito da dengue é tão perseguido como camelô no Rio de Janeiro”. E lá vinha o rapa, cheio de homens e disposição. Eu, pessoalmente, concordo com o companheiro do meio do caminho. Preferia que estivessem ajudando nos mutirões contra a dengue, que o negócio está sério demais. Digo que poderiam estar colaborando porque fazem altas propagandas dizendo que você deve realizar um mutirão no seu bairro, na sua escola, etc. e tal. Não fizeram, eles, o dever de casa, e quando poderiam concentrar esforços...
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Como escutei certa vez, trabalho é o que não falta. O que não tem mesmo é emprego.

mais trabalho

Pagamento mesmo, Manel num tá querendo liberar. Mas to quase chegando no paraíso. Trabalho aqui de dia (T1) e de noite (T2). O que eu recebo do T1 era pra pagar a internet e o aluguel, fora a conta no Panamá. Estou cortando esses gastos. Agora além de não ter que pagar aluguel (mas tenho que convencer o velho agora a instalar um chuveiro quente por aqui, se não vou acabar parando de tomar banho pela manhã) e contas de luz, gás, internet, e as outras que aparecem, vou receber um adicional do T2. Ou seja, tô ficando rico. Num tenho gastos, e os gastos que tenho tá arriscado sair no lucro aqui no Panamá. Posso até não receber a mais, mas vou pagar a menos... Pra compensar fico aqui sozinho pela madrugada, escrevendo no blog. Sozinho não, que as baratas quando o povo sai, aparecem pra fazer companhia. E ainda tem um ratinho. O nome dele é Fidel. Toda manhã Macarrão vai fazer a contabilidade do que consumi e sempre extrapola o limite pré-estabelecido. Aí a culpa é sempre do Fidel...
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Vou dormir que 5 horas me acordam aqui.

falando em trabalho...

Trabalhar no bar tem suas desvantagens. Ir embora. Já tentei várias vezes. Primeiro fui sincero, falei que tava bêbado demais pra ir embora. Depois fui mais direto, disse que tava pensando seriamente em dormir dentro do Panamá mesmo. Mas o velho nada de acatar minha brilhante idéia. Por fim, consegui engabelá-lo e dizer que seria muito importante um vigia noturno dentro do bar. “Olha só Seu Manel. Aqui do lado, o Belmonte, fica um cara lá dentro toda noite. Do outro lado da rua no Buteco da Garrafa, também. No tal de Spelunca Chique, idem. No Informal, no Ponto da Bossa, até no Caravele e no Stambul. Todos tem um vigia noturno. Olha o risco que o senhor tá correndo!”. Adoro o portuga. “Então tá, mas num mexe em nada”. “Claaaro! Mexer em quê? Vou trabalhar pro senhor. Falando nisso, quanto vai me pagar?”